Na
semana em que o Cineteatro São Luiz comemora 66 anos, a cantora Amelinha sobe
ao histórico palco cearense para apresentar seu novo show “Todo Mundo Vai
Saber”, neste domingo, dia 24 de março, às 18 horas. Com 45 anos de carreira, a
principal voz feminina do Pessoal do Ceará irá trazer algumas das faixas
escritas pelos compositores Caio Silvio e Ricardo Alcântara, autores das
canções do mais recente álbum, que dá título ao show e será apresentado pela
primeira em Fortaleza desde seu lançamento, em 2022. O repertório da
apresentação no Cineteatro São Luiz conta ainda com canções próprias que
fizeram sucesso e também músicas de compositores de sua terra natal
interpretadas por Amelinha.
No
mercado fonográfico em edição da gravadora carioca Deck e disponível nas
principais plataformas de áudio, “Todo Mundo Vai Saber” é composto de 12
canções, todas de autoria da dupla Caio Silvio (músico, autor e compositor) e
Ricardo Alcântara (publicitário, escritor e compositor), amigos de infância e
parceiros de composição desde os anos 1970. Os arranjos são do guitarrista
Robertinho do Recife e de Caio Silvio, com participação em estúdio do próprio
Robertinho do Recife e dos cearenses Jorge Hélder (baixo) e Pantico Rocha
(bateria), e de outros talentosos músicos.
O
álbum “Todo Mundo Vai Saber” traz praticamente todas as músicas inéditas,
exceto Sertão da Lua, que a cantora havia gravado em seu disco “Romance da Lua
Lua” (1983). O novo álbum conta com a participação de João Ramalho, filho de
Amelinha com o cantor Zé Ramalho, que gravou os arranjos da faixa título com
sua banda (a João Ramalho Trio - JPG) e participa dos vocais nas canções
“Noites de verão” e “Noites do Rio”.
Grande
parte das canções de “Todo Mundo Vai Saber” estarão no repertório do show deste
domingo no Cineteatro São Luiz, que contará também com sucessos da trajetória
de Amelinha, desde hits com os quais ganhou diversas premiações, como “Foi Deus
quem fez você”, “Mulher nova, bonita e carinhosa faz o homem gemer sem sentir
dor”, “Frevo Mulher” e Flor da Paisagem”, além de outras canções do Pessoal do
Ceará gravadas por ela, como Fagner, Belchior e Ednardo.
Show
Amelinha apresenta novo álbum “Todo Mundo quer Saber”
Data:
24 de março de 2024 (domingo) | Horário: 18h | Classificação indicativa: Livre
| Duração: 70 min
Entrada:
R$ 30,00 (meia-entrada) e R$ 60,00 (inteira) | Limitação de 40% da meia-entrada
| Assentos marcados
Local:
Cineteatro São Luiz - R. Major Facundo, 500, Centro
Horário
de funcionamento da bilheteria: Terça a Sexta - 9h30 às 18h / Sábado – 9h30 às 17h. Horários sujeitos a
alterações, de acordo com a programação. Telefone para contato: (85) 3252.4138
Venda
online: https://site.bileto.sympla.com.br/cineteatrosaoluiz/
Histórico
de Amelinha
por
Tárik de Souza
Nem
todos os movimentos musicais são devidamente detectados pelo radar dos analistas no momento em que despontam. Em
meio à leva de criadores nordestinos que
emigrou para o sudeste, o coletivo Pessoal do Ceará imprimiu sua marca a
parte, capitaneado por Raimundo Fagner,
Belchior, Ednardo, Rodger Rogério, Teti e uma
cantora que se destacaria como a principal voz feminina do grupo,
Amelinha. Na verdade, em 1970, ela já se
mudara para cursar Comunicação em São Paulo e começou a fazer aparições ainda amadoras em shows de seu
ex-colega de vestibular de arquitetura, Fagner,
o primeiro do grupo a decolar, com o álbum “Manera, Fru Fru Manera”, em
1973. No ano seguinte, Amélia Claudia Garcia Collares, cearense de Fortaleza,
nascida numa família de classe média de
amadores da música, iniciou sua carreira profissional com apresentações na TV e estreou em disco na
faixa “Ausência”, do clássico instantâneo
“Romance do pavão mysteriozo”, de Ednardo. Pouco depois, embarcava para
Punta Del Este, no Uruguai, numa
excursão a convite de Toquinho e Vinicius de Moraes. Encantado com sua voz, num texto em que cita o colega
pernambucano Manoel Bandeira, o poetinha
carioca escreveu para ela, de Itapoá, Bahia, onde estava radicado: “Vá,
jandaiazinha, abra as asas, alce vôo e
cante por aí tudo, porque você canta lindo. Se a estrela da manhã cantasse, seria como você, com este timbre
puro e cristalino de menina fazendo roda, que
deixa o peito da gente transparente e refrigera o ar em torno”.
Mas
Amelinha só estrearia solo em 1977, no impactante “Flor da paisagem”. Fagner (de cujo disco “Ave noturna” ela
participou nos vocais) assina a direção musical, dueta com ela no afiado “Depende” (parceria
com Abel Silva) e ainda fornece “Agonia”,
“Pobre bichinho” e “Santo e demônio” (com Ricardo Bezerra). Co-autor da
faixa título com Fausto Nilo, Robertinho
de Recife rasga sua guitarra em várias passagens do disco, que ainda tem cordas luxuriantes do maestro
Leo Perachi, um dos favoritos de Tom
Jobim. Neste cartão de visitas de ambientação cearense, outros autores
da região reúnem se em torno da estrela emergente, como Ednardo (“Ponta de
espinho”, “A cal mar se”), Petrúcio Maia
e Brandão, em “Senhora dona” (co-autor da anterior). E não falta o arremate de luxo, com Luiz Gonzaga e Zé
Dantas, no matreiro xote “Cintura fina”, a
primeira música do rei do baião que a embalou.
Já
associada ao compositor e cantor paraibano Zé Ramalho, com quem se
casaria, Amelinha tomou o país na faixa
título que ele dedicou a ela no disco seguinte, “Frevo mulher”, produzido por Carlos Alberto Sion.
No repertório do cintilante álbum, outra do
autor, “Galope rasante”, mais uma de Fagner (“Santa Tereza”, com Abel
Silva), o agudo “Coito das araras”, da
paraibana Cátia de França; jóias refinadas do vanguardista Walter Franco (“Divindade”), do pernambucano Geraldo
Azevedo (“Dia branco”, com Renato Rocha)
e até a surpreendente parceria do ex-Momento Quatro e futuro Boca Livre,
David Tygel com a modelo, atriz e poeta
Bruna Lombardi (“Que me venha esse homem”).
Na
faixa “Pelo vinho, pelo pão”, Amelinha participaria do icônico álbum do
autor, Zé Ramalho, “A peleja do diabo
com o dono do céu” (1979), e no festival da TV Globo, “MPB 80”, voltaria a explodir nas paradas com
a concorrente “Foi Deus quem fez você”
(Luiz Ramalho), outra produção de Sion. Embora classificada em segundo
lugar no certame, vendeu de imediato
mais de setecentos mil compactos. No mesmo ano, sairia seu terceiro álbum, sob direção musical de Zé
Ramalho, “Porta secreta”, que desvelava
outro sucesso original, “Gemedeira” (Robertinho de Recife-Capinan) e
ainda incorporava Jorge Mautner (“Senhora
da noite”, com Nelson Jacobina) a seu leque de autores. Não por acaso, a voz
incandescente da cantora inflamaria a faixa título do disco seguinte do compositor, “Bomba de estrelas” (Mautner/Zé
Ramalho).
Em
1982, mais um arrasa quarteirão. Um martelo, forma de repente, do cantador Otacílio Batista, adaptado por Ramalho, que
Amelinha, com sua emissão doce e incisiva,
transformou em canção lânguida, prelibada pelo título quilométrico:
“Mulher nova, bonita e carinhosa, faz o
homem gemer sem sentir dor”. A música nomeou mais um disco produzido por Zé Ramalho (e Mauro Motta), com
direito a um Fagner sobre poema da
portuguesa Florbela Espanca (“Frieza”), Djavan (“Água de lua”) e João do
Vale (“Amar quem eu já amei”, com
Libório), de cujo disco homenagem ela participou, em 1981, à bordo de “Estrela miúda” (com Luís Vieira). E
mais duas do poeta Salgado Maranhão,
“Trem da consciência” (com Vital Farias) e “Choro da lua” (com Herman
Torres). A fase lunar da cantora seria
expandida no “Romance da lua lua”, de Flaviola sobre poema do espanhol Garcia Lorca, incluída na trilha
sonora da novela “Pão, pão, beijo, beijo”, da TV Globo, em 1983, outra faixa título de um
disco que ainda trazia “Sertão da lua” (Caio
Silvio/R.Alcantara), “A gente precisa ver o luar” (Gilberto Gil) e “Lua
semente” (Zé Ramalho/ Zé Neumane), além
de incorporar a preciosa “Seresta sertaneza”, do erudito baiano Elomar.
Já sob
a produção de Mariozinho Rocha, “Água e luz” (Tavito/ Ricardo Magno), com participação do grupo Roupa Nova, em
1984, forneceria mais uma faixa principal
para trilha de novela da Globo (“Amor com amor se paga”). Incorporaria
ao repertório Alceu Valença (“Calango da
lacraia”), Lula Queiroga (“Armadilha”), os irmãos mineiros Lô e Marcio Borges (“Alunar”) e mais uma de
Gil (“Tempo rei”). Além de tocar o violão
na faixa, o baiano reverenciou a intérprete “pela beleza pássara de seu
canto”. Uma boa definição para o timbre
sedutor e flexível de Amelinha, apto tanto às agulhadas do frevo (“Siri na lata”, de Carlos Fernando em “Asas
da América no. 2”) quanto a incursões em
outros gêneros, como nos específicos “Só forró” (1994) e “Vento, forró e
folia” (2001). Em sua intensa
discografia, já houve espaço até para uma evocação das origens, no álbum “Pessoal do Ceará” (2002), ao lado dos
conterrâneos Ednardo (além do inescapável
“Pavão”, “Moletom e radar”, “Pastoril”, “Artigo 26”, “Enquanto engoma a
calça”, com Climério) e Belchior (“Como
nossos pais”, “Na hora do almoço”, “Medo de avião”, “A palo seco” e “Mucuripe”, com Fagner).
A
ressignificação da diva veio nas produções de Thiago Marques Luiz, “Janelas
do Brasil” (2011) e “Janelas do Brasil
ao vivo” (2013), também lançado em DVD. O
cardápio seleto e eclético transcende a nordestinidade impregnada em seu
canto, mas sem negá-la. Dos violeiros do
sudeste/centro oeste, Renato Teixeira (“Olhos profundos”) e Almir Sater (“Planície de prata”, com Paulo
Simões) à pepita do Clube da Esquina, “Sol
de primavera” (Beto Guedes/ Ronaldo Bastos), o encontro do paulistano
Marcelo Jeneci e o paraibano Chico Cesar
(“Felicidade”), clássicos de Belchior (“Galos, noites e quintais”), Ednardo (“Terral”) e Fagner (“Asa
partida”, com Abel Silva), que participa do
DVD, assim como o maranhense Zeca Baleiro (autor de “O silêncio”) e o
paulistano Toquinho (em “Valsinha”, de
Vinicius de Moraes e Chico Buarque). Ao trafegar por tantas latitudes estéticas, esta flor da
paisagem cearense evidencia que sua arte frutificou sem fronteiras, indomada. E segue caminhos
autônomos, sempre em dia com o seu tempo.
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