Em uma
movimentação inédita, a Associação Cearense de Magistrados (ACM) acaba de
lançar a campanha "Diretas Já" para o Judiciário, com o objetivo de
promover reforma no sistema de escolha dos dirigentes do Tribunal de Justiça do
Estado do Ceará. O lançamento oficial ocorrerá no dia 08 de novembro, em um
evento na sede da Associação Cearense de Magistrados, com a participação de
magistrados da capital cearense e do interior do Estado onde serão discutidos
os passos para a implementação dessa mudança.
Na oportunidade,
a ACM irá protocolar formalmente requerimento da mudança do regimento interno
do TJCE, a fim de que magistrados de primeiro grau passem a ter direito de voto
nas eleições para os cargos diretivos do Tribunal: Presidente, Vice-presidente
e Corregedor.
Atualmente,
a escolha dos presidentes nos tribunais é baseada em sistemática que revela, ao
ver da ACM, contradição aos princípios
democráticos implementados pela Constituição da República Federativa do Brasil.
Apenas desembargadores, magistrados do 2º grau de jurisdição, têm o direito de
concorrer aos cargos de liderança, e somente eles podem votar para a eleição
dos cargos diretivos do Judiciário, restando excluída a grande maioria dos
membros do Poder, os juízes de primeiro grau. Na prática, a situação limita a
participação dos magistrados em um processo que deveria primar pela amplitude
do princípio democrático, um dos fundamentos da Constituição Federal.
Ainda
nos termos da Constituição da República, constituem Órgãos do Poder Judiciário
Estadual juízes e tribunais estaduais, de sorte que a eleição para os órgão
diretivos e de representação do Poder não deveria ser restrita a apenas
Desembargadores, excluindo do processo democrático os demais juízes, que são
igualmente membros da instituição.
A
Associação Cearense de Magistrados pontua, ainda, como fundamento do pedido e
da campanha iniciada, que, além da contrariedade ao princípio democrático, a
falta de representatividade da eleição nos moldes atuais, restrita a apenas uma
parcela dos membros do Poder Judiciário, é responsável por parte dos problemas
enfrentados pelo Judiciário, pois ignora a pluralidade de visões que somente
uma eleição ampla permitiria vislumbrar. Os juízes de primeiro seriam, assim,
mais ouvidos nos processos de decisão administrativa, considerando, também, o
fato de representarem eles a porta de entrada de praticamente todas as causas
que são levadas ao Poder Judiciário.
Boa
parte dos processos judiciais iniciam e são concluídos no primeiro grau de
jurisdição. O primeiro grau de jurisdição é responsável, também, pela chamada
“instrução do processo”, fase em que as partes e suas testemunhas são ouvidas.
Os juízes de primeiro grau encontram-se nas mais diversas e distantes comarcas
do Estado. Essa realidade demonstra que estão eles mais próximos da sociedade
para quem o Poder Judiciário presta os seus serviços. Nada justifica a ausência
de participação desses magistrados e magistradas no mecanismo de escolha do
Presidente, do Vice-presidente e do Corregedor do Poder.
Outras
instituições do chamado “Sistema de Justiça”, tais como o Ministério Público e
a Defensoria Pública, não possuem regra restritiva quanto à participação de
seus membros no processo de escolha de suas direções, o que tem demonstrado ao
longo dos anos inclusive reconhecimento da sociedade sobre serviços públicos
prestados por tais instituições.
O
pedido formulado pela ACM junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará busca
também cumprir compromisso da Associação com toda a magistratura ante o anseio
da maioria dos magistrados cearenses. Tanto assim, que na última eleição para o
Conselho Executivo da ACM, ambas as chapas tinham como propostas de campanha
buscar junto ao TJCE a implementação de tal direito via alteração do regimento
interno.
Para o
presidente da ACM, o Juiz Hercy Alencar, "mostra-se paradoxal defender a
democracia e, simultaneamente, manter uma estrutura pouco democrática dentro
dos tribunais, onde apenas um grupo restrito tem o poder de escolher e
decidir". Ele observa que a configuração atual resulta em decisões tomadas
por uma minoria em nome de todos, estabelecendo uma estrutura de poder que
acaba deixando de considerar a amplitude do Judiciário como um todo.
A
campanha "Diretas Já, no Judiciário” traz como slogan “Democracia na
justiça, este é o nosso voto” e visa promover a ideia de que todos os juízes,
de primeiro e segundo graus, devem ter o direito de votar na eleição dos
líderes dos tribunais."A ausência de participação de todos gera um
mal-estar entre aqueles que são excluídos. O processo de escolha dos dirigentes
deveria ser amplo, o que o tornaria mais justo e equitativo, em uma decisão
política com a participação de todos os componentes do Poder Judiciário",
explica Hercy Alencar.
A
busca por eleições diretas nos Tribunais de Justiça não é recente, porém a
campanha é inédita no Estado do Ceará. Segundo Frederico Mendes Júnior,
presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, a AMB já lançou várias
campanhas ao longo dos anos, visando implementar mudanças que permitam eleições
diretas semelhantes às dos Poderes Executivo e Legislativo, além de órgãos como
o Ministério Público e a Defensoria Pública. No entanto, muitas dessas
Propostas de Emenda à Constituição (PECs) foram negligenciadas no processo
legislativo devido à lentidão e à falta de prioridade dos legisladores”,
comenta.
Helga
Medved, vice-presidente da ACM, afirma que a iniciativa representa uma renovada
luta pela voz da magistratura: "Este é um movimento crucial para garantir
que todos os juízes possam participar ativamente das decisões que afetam o
funcionamento do Judiciário. A democracia verdadeira exige que todos tenham voz
e voto, e isso é o que buscamos com a campanha 'Diretas Já'".
A ACM
espera que essa mobilização traga à tona um debate nacional sobre a necessidade
de reformar o sistema de escolha dos dirigentes dos Tribunais e promova uma
maior democratização dentro da instituição. “O sucesso da campanha dependerá da
capacidade de mobilizar a comunidade judicial e da receptividade das propostas
por parte das instituições legislativas. Enquanto isso, a ACM continua sua
batalha pela construção de um Judiciário mais democrático e representativo para
todos os magistrados”, finaliza Helga.
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